quinta-feira, 8 de julho de 2010

Eu, a Mente

Qual é a relação entre a matéria e a mente?
Ainda hoje não se sabe a localização da consciência no corpo. É como se ela não estivesse em lugar algum, isto é, nós não estamos em lugar algum.
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Eu sou uma mente e não posso ser situada em nenhum lugar no Espaço (somente no Tempo) embora meu único meio de comunicação com as outras mentes é através deste Espaço, Tempo e matéria.
Cada um de nós é uma mente isolada das outras. Nunca podemos realmente transmitir uma ideia, um pensamento ou um sentimentos, mas apenas sinais de linguagem e padrões para que as outras mentes interpretem e assim reproduzam replicas destas ideias, pensamentos e sentimentos em seu entendimento. Fazemos o possível para que estas interpretações sejam o mais fieis possíveis ao original, mas no fim são outras ideias em outras mentes. Meras interpretações, meras representações.
Nunca poderemos realmente conhecer uns aos outros. Tudo que temos são estas interpretações, estas réplicas. Nunca conheceremos a "coisa em si".
Somos apenas mentes recebendo sinais e produzindo réplicas umas das outras, interpretando umas às outras, e nunca realmente nos conhecendo.
Uma pessoa que "conheço" é apenas uma interpretação armazenada em meu entendimento.
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Cada consciência é uma ilha ligada às outras através desta realidade que é nosso meio de comunicação, e nós somos Aqueles-que-Conhecem-e-que-Nunca-Podem-Ser-Conhecidos.
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"A mente é uma coisa estranha e maravilhosa. Não sei se ela será capaz de desvendar a si mesma. Todo o resto talvez: desde o átomo até o universo. Tudo, exceto a si mesma."
Trecho do filme "Invasion of the Body Snatchers- Os Invasores de Corpos"

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Despersonalização (Dormência Mental)

Em psicologia e psiquiatria, a despersonalização é entendida como "uma desordem dissociativa caracterizada por experiências de sentimentos de irrealidade, de ruptura com a personalidade, processos amnésicos e apatia."
É um estado no qual a pessoa tem a sensação de estar "fora de si" como se estivesse em algum outro lugar controlando à distancia seu corpo e sua mente como um boneco.
É este estado que chamo de Dormência Mental, e acontece quando "tomamos consciência de nossa consciência".
Explico:
nosso mundo é dividido em objeto e sujeito: Objeto é tudo aquilo que podemos conhecer, isto é, as coisas das quais podemos ter consciência(coisas, pensamentos, espaço, tempo, sons, etc). Sujeito é aquele que conhece as coisas mas que nunca pode ser conhecido, é aquele que tem consciência daquilo que está "fora", do objeto, do universo.
O fato de dizermos "eu conheço tal pessoa" não significa que conhecemos aquele sujeito, pois este não pode ser encontrado, é o "eu" da pessoa, a consciência que só pode ser localizada no tempo e nunca no espaço. Apenas o sujeito pode ter uma leve ideia de si mesmo.
O que ocorre na despersonalização é um fenômeno (acidental ou proposital) no qual o sujeito "trapaceia" e toma consciência de si mesmo e, como só podemos ser conscientes daquilo que está fora de nós, ocorre uma ruptura, uma divisão da consciência em duas: uma que conhece e uma que é conhecida.
Daí vem a sensação de estar fora de si mesmo, e o desespero vem com a sensação de irrealidade pois neste momentos percebemos o quanto infundada e sem sentido é nossa mente e consciência. É como abrir as portas da percepção e ver como somos feitos de nada e o quanto estamos afundados em abstrações. De fato, neste momento percebemos que nada é concreto, nem espaço nem tempo, nem nada de nada.
É claro que no momento em que ocorre eu não tenho a capacidade de analisar tudo isso, já que a minha preocupação maior é a de voltar ao normal e perder toda essa consciência maldita. Toda esta analise vem depois quando penso sobre o ocorrido.
É a última saída da caverna rumo ao "deserto do real".

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Sobre a Memória e os Perigos das Dimensões Ocultas

Pouco pensamos na memória, e pouco é necessário antes que fiquemos perplexos.
Vejamos as coisas do seguinte modo: tudo nesta existência acontece (está acontecendo) simultâneamente. Aquilo que chamamos de passado são apenas informações no cérebro, o futuro podemos apenas imaginar e o presente é um espaço de tempo infinitamente pequeno entre estes dois, ou seja, também inexistente.
"Tempo", então, consiste em algo que não existe separando duas outras coisas que não existem. É portanto, inexistente.
De onde surge a ilusão de tempo?
A memória produz esta ilusão em nossa mente, fazendo nos acreditar que as coisas acontecem uma depois da outra. É uma maneira de organizar os acontecimentos do universo em nossa mente.
É uma coisa cósmica.
É muito difícil, talvez impossível para nós imaginar um universo sem tempo e o seguinte pensamento pode nos vir à cabeça: uma coisa cuja existência não tem duração nenhuma, isto é, zero, é para nós uma coisa que nunca existiu.
A noção de espaço e das três dimensões nos são fornecida pelos cinco sentidos, já a noção desta quarta dimensão chamada "tempo" nos é proporcionada pela memória que poderia então ser descrita como um sexto sentido através do qual sentimos a quarta dimensão.

Imagine se uma pessoa nasce com uma má formação no cérebro: ela não possui memória.
Do ponto de vista desta pessoa a sua própria existência "não existe", pois ela não sentiu nenhuma duração, nenhum tempo. Ela só pode existir do ponto de vista das outras pessoas que conseguem perceber uma dimensão que ela não consegue. Ela sequer tomaria consciência disso que chamamos de tempo.
Seu corpo reagiria aos estímulos de dor, frio, etc, mas essa pessoa não teria evolução em sua mente, não acumularia nenhuma informação em sua mente que ela pudesse chamar de passado. Seu corpo estaria à mercê de qualquer coisa que quisessem fazer com ela.
Esta pessoa teria mente?
...
O que nos leva à seguinte questão: e quanto às outras dimensões além do tempo que não podemos perceber?
Segundo os cientistas existem cerca de 10 ou 11 dimensões em nosso universo. Não é possível que hajam seres que percebam estas dimensões?
Para eles nós estamos vegetando.
Somos apenas marionetes em suas mãos.

dimensões


quinta-feira, 17 de junho de 2010

Pinturas de Wayne Barlowe

O artista Wayne Barlowe ficou famoso por suas pinturas de cenas e paisagens no inferno e em outros planetas.
Aqui vai uma pequena amostra de suas criaturas demoníacas:











Site oficial: http://www.waynebarlowe.com/

terça-feira, 15 de junho de 2010

Eu, o Erro de Uma Geração

Sempre tenho esta sensação de estar fora das coisas e de estar enganando as pessoas quando ando nas ruas. Sensação de estar sempre usando disfarces, tentando parecer semelhante a meus semelhantes.
Provavelmente isso vem dos tempos da escola na época de meus 5 a 18 anos(crianças e adolescentes podem ser mortalmente cruéis quando querem). Esta foi a época em que começou a pressão intensa em minha personalidade por aquilo que eu tinha que ser e tinha que fazer mas até hoje não consigo: não consigo me expressar como deveria, não consigo me sentir deveria, não consigo ver como deveria.
Por isso, evito conviver com as pessoas. Aquele monstro nascido nos tempos da escola entrou na minha cabeça, fez um buraco no meu cérebro e mora lá dentro até hoje. Ele se alimenta de vergonha, medo e constrangimento, mas eu não estou mais disposto a cooperar com ele.

Tendo dito isto,

acabou-se o tempo em que eu me iludia pensando que era melhor do que os outros. Hoje eu sei que se não vivêssemos nos tempos que vivemos eu nem sequer seria selecionado para sobreviver. Eu sou parte da falha dessa geração causada pelas constantes experiências da mãe natureza e também da sociedade, já que ambas em seus sistemas tendem a selecionar sempre os mais adaptados ao meio seja ele qual for.
Sei que se fossemos uma manada de zebras, por exemplo, fugindo da seca, eu seria um daqueles fracos e cansados que ficaria para trás servindo de alimento para os leões dando a oportunidade para os melhores fugirem.
Eu deveria ter sido selecionado naturalmente à extinção, no entanto aqui estou enquanto muitos dos fortes são exterminados nos becos da sociedade.
Sou apenas um fragmento do erro da evolução neste imenso jogo, não tenho nada do que me orgulhar.

Não digam que eu estou escolhendo o caminho mais fácil, não há nada mais difícil nessa vida do que aceitar a própria vida.
Afinal, fracos ou fortes, todos nós chegaremos sempre ao mesmo final.
Não nos afundemos em nossas ilusões.
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.
.
Ou tudo ao contrário...
Eu não sei de nada, só falo aquilo que me vem na cabeça.
Não existe verdade alguma nas coisas.

sábado, 15 de maio de 2010

Desgraçados

"Desgraçados" é uma obra ímpar de Lourenço Mutarelli.
Aqui eu transcrevo um trecho que significa muito para mim:

"...não foram apenas lindas poesias e boas piadas que aprendi neste sanatório. É engraçado, mas eu levei muito tempo para perceber que estava num hospital psiquiátrico (...), uma espécie de prisão onde se detinham pessoas que ainda possuíam sensibilidade.
Para esse mundo, sensibilidade não é qualidade ou característica, é sintoma.
Lá fora vagam os mortos-vivos, aqui dentro estão detidos aqueles que por algum motivo perceberam o absurdo deste sistema estabelecido numa convenção estúpida, castradora, cruel e patética.
Mas mesmo assim a sensibilidade retida neste manicômio é temporária em um breve tempo, todos que aqui chegam são neutralizados bombardeados por psicotrópicos...hipnóticos...tranquilizantes...
'As trágicas fileiras de escravos das drogas se espicham a perder de vista pelos vales desta humanidade cada vez menos humana e sempre mais psicodélica, vazia, enfastiada, inconsequente e mesmificada no sofrimento neurótico e psíquico.' dirá Hermógenes. Tornando-se assim pessoas normais...equilibradas...nem mais nem menos...o meio...o comum... o igual. Mas já disse o poeta que a natureza não faz nada igual. 'Não existem dois flocos de neve iguais.' Mas não importa, eles querem igualar, afinal 'Todos são iguais perante Deus.'.
Mesmo assim, ainda existem aqueles que são mais resistentes, aqueles que são tão convictos de suas verdades e de seus ideais, que tornam-se indestrutíveis. É sobre estas pessoas que falo agora. Pessoas únicas, ímpares. Pessoas que conheci neste sanatório. Figuras dotadas de uma força inimaginável, e quando digo força, não me refiro à força física, tão cultuada pelos estúpidos. Não me refiro a nenhum tipo de força destrutiva, pois estas pessoas a quem me refiro sabem que ser forte não é poder destruir, mas saber construir."
(...)
"Na última sessão de terapia perguntei ao Dr. se eu era um homem louco. Rindo ele respondeu:'A única coisa que nos torna diferentes é que eu possuo a chave do portão'.".

sábado, 8 de maio de 2010

Sobre a Liberdade, a Sociedade, o Sofrimento e a Morte

Ao nascer, o homem, assim como todos os animais, é acorrentado num complexo sistema de instintos e vontades dos quais será escravo pelo resto da vida. Porém, ele é o único animal ao qual é dada a capacidade de escapar destas prisões, a capacidade de escapar do medo, da vontade irracional e insaciável. A capacidade de se livrar das correntes da necessidade de sobrevivência e do sofrimento e de se tornar dono de si mesmo através da mente racional.
Mas acontece exatamente o contrário: nossos medos, angústias, nossa insaciedade e nosso sofrimento são muito maiores e mais intensos do que na vida dos irracionais.

Há quem diga que o homem é livre, mas a verdade é que o nós, com toda nossa sabedoria, fazemos o oposto de nos libertar. Nós criamos este mundo de faz de conta que é a sociedade, onde nossas mentes são aprisionadas e manipuladas e onde todo nosso discernimento é iludido por coisas abstratas e imaginárias. Nos tornamos totalmente alheios a nós mesmos escravizados por estas mentiras nas quais somos todos obrigados a acreditar. Elas representam o fracasso do homem.
Fracassamos em superar animal. Eramos os únicos capazes de sair do abismo animalesco da vontade cega e de alcançar algo além, mas nos satisfazemos em simplesmente fingir que somos donos das coisas.

E o maior erro que cometemos é a maneira como lidamos com a morte, pois ela é o que mais causa sofrimento em nossa espécie desde os tempos remotos quando começamos a pensar. Isto porque somos os únicos animais neste mundo que sabemos que um dia vamos morrer e ao mesmo tempo somos os únicos que nos apegamos. Somos os únicos que temos a ilusão de posse e nosso medo é elevado ao máximo por causa disso. Em nossos pensamentos transformamos a morte na coisa mais terrível de todas que nos tirará tudo aquilo que temos e amamos.
Como podemos ter tanto domínio sobre o mundo ao nosso redor e não termos o mínimo domínio sobre nós mesmos e nosso sentimentos?
Fazemos novamente o oposto do que a razão dita: nos esforçamos ao máximo para ignorar a morte e tentamos desesperadamente esquecê-la. Temos medo de sequer pensar nela. Nos agarramos com todas às forças àquilo que nunca foi e que nunca será nosso: a vida.

A vida inteira deveria ser uma preparação para a morte. Uma coisa tão certa assim nunca poderia pegar de surpresa seres ditos racionais.
Para que gastar toda nossa trabalhando, nos reproduzindo, lutando, comprando coisas se um dia tudo vai acabar e nada será realmente nosso? Não deveríamos nos apegar a nada nem a ninguém. A morte vai tirar tudo inevitavelmente mais cedo ou mais tarde.

Novamente vem o fracasso humano para nos cegar impedindo que vejamos a verdade: este tipo de ideia sobre a morte não é bem visto pela sociedade pois ela manipula o pensamento para impedir que o homem quebre as correntes animalescas e se liberte do medo e do sofrimento. Ela nos ilude e cria fórmulas para que nos tornemos "felizes" do jeito que ela quer. Inventa metas imaginárias e nos convence de que são nossas para que as persigamos até o fim sem conhecer a verdadeira intenção de tudo isso que é alimentar essa máquina monstruosa.

A sociedade não eleva o homem a um patamar superior ao dos animais, ela o rebaixa ao mesmo nível deles envenenando em nós aquilo que permite que sejamos donos de nós mesmos. Ela nos aprisiona com ilusões e enfeita a vida com carros bonitos e mulheres fabricadas até que não possamos sequer saber que estamos encarcerados. Nos tornamos animais de rebanho, meras engrenagens do Sistema e trabalhamos até que estejamos velhos e cansados e então somos descartados.
As escolhas que temos são semelhantes à do rato num labirinto que pode escolher se vai para a esquerda ou para a direita. Caímos na rotina animalesca de acordar, lutar pela sobrevivência, pela reprodução e contra a morte.

Não há prova maior de que o homem pode ser livre do que quando ele chega ao momento da morte com serenidade. Não maior prova de libertação do que essa, e é por isso que a sociedade abomina o suicídio: ele representa a máxima liberdade que temos.
Aceitando a morte não venderíamos nossa vida em busca de algum objetivo qualquer que nos impusessem.

A Sociedade estimula perversamente os medos e vontades em nossa mente nos impedindo de evoluir pois quando esquecemos que vamos morrer nós nos apegamos e somos facilmente manipulados.
Somos meras ovelhas. Nunca poderemos ser realmente livres enquanto nossa mente estiver presa e enquanto formos obrigados a ser animais.


quinta-feira, 6 de maio de 2010

Prisão

Doutor, doutor! O que há de errado comigo?
Sinto a sombra da morte fria de minha alma sugando cada gota de energia que me resta.
Meu coração dispara e minhas mãos estão suadas.
O choro me engasga preso na garganta e o grito não sai.
A respiração não é suficiente, não é suficiente. Sinto a dormência mental tomando conta de todo o meu ser.
Minha alma chora arrependida todos os dias por ter saído do conforto da não-existência para nascer nesta prisão cruel e sem sentido. Meu corpo implora para voltar para a terra e para o descanço no colo quente da mãe natureza de onde nunca deveria ter saído.
Meus olhos doem. Estou tão cansado mas não consigo dormir.
O frio cresce em meu peito e a angústia tira minha respiração.
Me ajude doutor!
Dê um nome a este sentimento, por favor. Mate-o em mim antes que ele me mate.
Por favor, não me deixe congelar aqui fora no escuro.
Me ajude a voltar para dentro. Me ajude a enlouquecer novamente.
Por favor.

Pink Floyd - Hey You

Será o sofrimento apenas mais um mecanismo de sobrevivência desenvolvido nos bilhões de anos da evolução?

terça-feira, 20 de abril de 2010

A Obra dos Inacabados

Mesmo em seu fim, o caído se juntará a aqueles que o maltratam e cairá novamente num céu desolado de perdição e desolação.
Sua mão é escura e uma pedra lhe cobre a cabeça de forma singular alterando-lhe a percepção da manhã.
Das profundezas da selva mais escura por entre as árvores antigas sob as montanhas do luar, o vento canta a melodia dos desesperados. Uma fumaça negra paira no ar saída de bocas ocultas no interior daquela terra. Os vermes se deleitam com seu odor e os insetos se contorcem em júbilo sob a luz cinzenta da Lua que penetra por entre os galhos velhos enquanto os gritos ensurdecedores de cem mil almas elevam-se na noite e as estrelas testemunham o nascimento da obra maldita dos desprovidos de consciência.
É dura a pobre maldição daqueles que não falam.
É maldita a deserção daqueles que não escutam.
Somos todos seus fantoches e a floresta nos encontrará.
Digam isto às bestas incrédulas do passado. Que sejam amparadas por sua cabeça degoladora de crianças e que morram sob a obra dos inacabados.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Pinturas de Zdzislaw Beksinski

Zdzisław Beksiński foi um pintor, escultor e fotógrafo nascido em 1929 e foi assassinado em 2005.
14 imagens valem por 14000 palavras:








Estes são apenas alguns exemplos de sua obra incrível.
Site oficial: http://www.beksinski.pl/
Mais imagens: http://lcrazzy1.narod.ru/image/fantasy/zdzislaw_beksinski/1.htm

sábado, 17 de abril de 2010

Máquina

A Sombra da Máquina se estende pelo campo, atravessa as colinas e toca minha alma.
Seu som é como os gritos de bilhões de espíritos sendo quebrados, pois ela se alimenta de crianças.
Sim, ela quebra seus espíritos e usa seus corpos na produção de seu combustível hediondo.
Eu quero correr, quero fugir, mas não consigo. Já corri o mais longe que pude.
Estou cansado.
Só há uma saída agora. Uma única saída!
Mas o preço é muito alto, eu não posso pagar. Ainda não.
E enquanto estou sentado no verde gramado sob a sombra terrível da Máquina, sinto o vento frio que foge dela e ouço o rizo alegre daqueles que conseguiram pagar o preço da morte.
Como eu queria ir junto. Mas não consigo.
Ainda não.
Os gritos se aproximam a cada segundo.
Ela nunca conseguirá quebrar meu espírito, é por isso que doerá tanto.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Dinossauros

No dia de minha morte eu vaguei pela Terra escaldante uma última vez.
Já não podia mais sentir os pés pois estavam queimados assim como a pele grossa de minhas costas.
O ar sufocava a cada respiração. Eu o sentia entrar passar pela garganta até os pulmões e queimava por dentro. Sentia gosto de sangue escorrendo na garganta.
Ao longe eu podia ver o vapor subindo do chão levando as últimas gotas de água. Já não havia mais cheiro de carne podre, minha família havia ficado para trás.
O céu estava branco.
Esse foi o cenário do dia de minha morte. Lá no alto um segundo Sol se aproximava. Sua luz e seu calor eram incrivelmente superiores aos do primeiro.
Os fracos morreram, mas eu ainda resistia em minha última hora.
Senti o cheiro e vi ali caído no meio do nada uma camarada ainda vivo. Podia-se ver suas costelas se movimentando num esforço descomunal para continuar respirando aquele ar apocaliptico.
Como somos tolos! Porque continuamos respirando nesses dias?

O velho instinto tenta aguçar meus sentidos e minha mente entra no estado de batalha uma última vez. Lá dentro a voz de infinitos ancestrais gritam dentro de cada veia e suas vozes ressoam em minha mente insignificante. A mensagem é clara: "SOBREVIVA!"
Não tenho capacidade para sobrepujar a vontade. Me aproximo para atacar como sempre fazia quando meus companheiros estavam comigo mas não tenho forças, minhas pernas não respondem, não enxergo como antes, não consigo respirar.
Num último impulso de vontade de vida o moribundo a meus pés se assusta e, antes de perder a consciência, acerta um golpe profundo rasgando minha pele e entranhas. Desvaneço e desmorono ao seu lado. Somos o mesmo.
Meu olho queima em contato com o chão escaldante. Sinto cheiro de carne queimada. Não importa mais, o calor destruiu meus nervos.
Me entrego completamente ao fim e descanso pela primeira vez em minha vida. Não há mais pelo que lutar.
O sangue escorrendo penetra no solo mostrando-me o caminho.
Minha carne se espalha e frita no chão seco e eis o que vejo em meu último dia: o segundo Sol cai sobre Terra para acabar os poucos que restaram. Vejo o céu se transformar em fogo e um estrondo destói o que me resta de audição.
Foi a coisa mais linda que ninguém jamais viu e jamais verá verá. Foi o último dia de minha vida. O fim da luta.
O alívio absoluto toma conta de meu corpo e já não sinto nada. Nada mais a temer.
Meu espírito morre junto com meu sofrimento.

domingo, 11 de abril de 2010

À Noite

Lembrei-me de uma coisa que me entristeceu.
Às vezes de madrugada eu sinto o espírito de um velho cachorro meu andando na cama. Não sei se é sonho ou se é de verdade, mas acontece com certa frequência e me dá arrepios. Ele sempre fazia isso quando era vivo pois era bem pequeno e podia dormir na cama.
Se acotecer novamente eu tentarei reunir coragem para levantar a cabeça, olhar e talvez conversar um pouco com ele e perguntar como é morrer.
Constantemente eu o vejo em sonhos onde as pessoas me dizem que ele não havia realmente morrido, mas nunca me dizem o motivo pelo qual todos pensavam que sim.
Me emociono todas as vezes.
Mas esse negócio de ele ficar andando na cama me dá medo.

domingo, 4 de abril de 2010

O Coração da Criancinha

Há alguns anos havia uma criança que, brincando e se escondendo por ruas escuras, encontrou um monstro que a comeu viva.
Mais tarde o monstro defecou e em meio aos fétidos excrementos, cabelo não digerido e vermes, a merda tomou consciência, encontrou o coração daquela criança e disse consigo mesma:
"Hoje sou merda, mas um dia fui aquela criança alegre que brincava de esconder pelas ruas escuras com seus amiguinhos. Este era meu coração e agora é o que tenho de mais precioso."

Ainda não perdi aquele meu coração.
Hoje vivo num mundo de excrementos que se disfarçam de homens e se esquecem de que um dia foram criancinhas comidas pelo monstro e que hoje não passam de merda disfarçada igual a mim.
Mas eu me lembro, pois guardo o coração ainda sujo e agonizante daquela criancinha que perde seu calor a cada dia e apodrece.
Eu sei que um dia eu terei que enterrá-lo pois o cheiro é insuportável.
Sei que um dia me esquecerei.
Sei que um dia atrairei outras crianças para o monstro comer.