sábado, 8 de maio de 2010

Sobre a Liberdade, a Sociedade, o Sofrimento e a Morte

Ao nascer, o homem, assim como todos os animais, é acorrentado num complexo sistema de instintos e vontades dos quais será escravo pelo resto da vida. Porém, ele é o único animal ao qual é dada a capacidade de escapar destas prisões, a capacidade de escapar do medo, da vontade irracional e insaciável. A capacidade de se livrar das correntes da necessidade de sobrevivência e do sofrimento e de se tornar dono de si mesmo através da mente racional.
Mas acontece exatamente o contrário: nossos medos, angústias, nossa insaciedade e nosso sofrimento são muito maiores e mais intensos do que na vida dos irracionais.

Há quem diga que o homem é livre, mas a verdade é que o nós, com toda nossa sabedoria, fazemos o oposto de nos libertar. Nós criamos este mundo de faz de conta que é a sociedade, onde nossas mentes são aprisionadas e manipuladas e onde todo nosso discernimento é iludido por coisas abstratas e imaginárias. Nos tornamos totalmente alheios a nós mesmos escravizados por estas mentiras nas quais somos todos obrigados a acreditar. Elas representam o fracasso do homem.
Fracassamos em superar animal. Eramos os únicos capazes de sair do abismo animalesco da vontade cega e de alcançar algo além, mas nos satisfazemos em simplesmente fingir que somos donos das coisas.

E o maior erro que cometemos é a maneira como lidamos com a morte, pois ela é o que mais causa sofrimento em nossa espécie desde os tempos remotos quando começamos a pensar. Isto porque somos os únicos animais neste mundo que sabemos que um dia vamos morrer e ao mesmo tempo somos os únicos que nos apegamos. Somos os únicos que temos a ilusão de posse e nosso medo é elevado ao máximo por causa disso. Em nossos pensamentos transformamos a morte na coisa mais terrível de todas que nos tirará tudo aquilo que temos e amamos.
Como podemos ter tanto domínio sobre o mundo ao nosso redor e não termos o mínimo domínio sobre nós mesmos e nosso sentimentos?
Fazemos novamente o oposto do que a razão dita: nos esforçamos ao máximo para ignorar a morte e tentamos desesperadamente esquecê-la. Temos medo de sequer pensar nela. Nos agarramos com todas às forças àquilo que nunca foi e que nunca será nosso: a vida.

A vida inteira deveria ser uma preparação para a morte. Uma coisa tão certa assim nunca poderia pegar de surpresa seres ditos racionais.
Para que gastar toda nossa trabalhando, nos reproduzindo, lutando, comprando coisas se um dia tudo vai acabar e nada será realmente nosso? Não deveríamos nos apegar a nada nem a ninguém. A morte vai tirar tudo inevitavelmente mais cedo ou mais tarde.

Novamente vem o fracasso humano para nos cegar impedindo que vejamos a verdade: este tipo de ideia sobre a morte não é bem visto pela sociedade pois ela manipula o pensamento para impedir que o homem quebre as correntes animalescas e se liberte do medo e do sofrimento. Ela nos ilude e cria fórmulas para que nos tornemos "felizes" do jeito que ela quer. Inventa metas imaginárias e nos convence de que são nossas para que as persigamos até o fim sem conhecer a verdadeira intenção de tudo isso que é alimentar essa máquina monstruosa.

A sociedade não eleva o homem a um patamar superior ao dos animais, ela o rebaixa ao mesmo nível deles envenenando em nós aquilo que permite que sejamos donos de nós mesmos. Ela nos aprisiona com ilusões e enfeita a vida com carros bonitos e mulheres fabricadas até que não possamos sequer saber que estamos encarcerados. Nos tornamos animais de rebanho, meras engrenagens do Sistema e trabalhamos até que estejamos velhos e cansados e então somos descartados.
As escolhas que temos são semelhantes à do rato num labirinto que pode escolher se vai para a esquerda ou para a direita. Caímos na rotina animalesca de acordar, lutar pela sobrevivência, pela reprodução e contra a morte.

Não há prova maior de que o homem pode ser livre do que quando ele chega ao momento da morte com serenidade. Não maior prova de libertação do que essa, e é por isso que a sociedade abomina o suicídio: ele representa a máxima liberdade que temos.
Aceitando a morte não venderíamos nossa vida em busca de algum objetivo qualquer que nos impusessem.

A Sociedade estimula perversamente os medos e vontades em nossa mente nos impedindo de evoluir pois quando esquecemos que vamos morrer nós nos apegamos e somos facilmente manipulados.
Somos meras ovelhas. Nunca poderemos ser realmente livres enquanto nossa mente estiver presa e enquanto formos obrigados a ser animais.


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