terça-feira, 20 de abril de 2010

A Obra dos Inacabados

Mesmo em seu fim, o caído se juntará a aqueles que o maltratam e cairá novamente num céu desolado de perdição e desolação.
Sua mão é escura e uma pedra lhe cobre a cabeça de forma singular alterando-lhe a percepção da manhã.
Das profundezas da selva mais escura por entre as árvores antigas sob as montanhas do luar, o vento canta a melodia dos desesperados. Uma fumaça negra paira no ar saída de bocas ocultas no interior daquela terra. Os vermes se deleitam com seu odor e os insetos se contorcem em júbilo sob a luz cinzenta da Lua que penetra por entre os galhos velhos enquanto os gritos ensurdecedores de cem mil almas elevam-se na noite e as estrelas testemunham o nascimento da obra maldita dos desprovidos de consciência.
É dura a pobre maldição daqueles que não falam.
É maldita a deserção daqueles que não escutam.
Somos todos seus fantoches e a floresta nos encontrará.
Digam isto às bestas incrédulas do passado. Que sejam amparadas por sua cabeça degoladora de crianças e que morram sob a obra dos inacabados.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Pinturas de Zdzislaw Beksinski

Zdzisław Beksiński foi um pintor, escultor e fotógrafo nascido em 1929 e foi assassinado em 2005.
14 imagens valem por 14000 palavras:








Estes são apenas alguns exemplos de sua obra incrível.
Site oficial: http://www.beksinski.pl/
Mais imagens: http://lcrazzy1.narod.ru/image/fantasy/zdzislaw_beksinski/1.htm

sábado, 17 de abril de 2010

Máquina

A Sombra da Máquina se estende pelo campo, atravessa as colinas e toca minha alma.
Seu som é como os gritos de bilhões de espíritos sendo quebrados, pois ela se alimenta de crianças.
Sim, ela quebra seus espíritos e usa seus corpos na produção de seu combustível hediondo.
Eu quero correr, quero fugir, mas não consigo. Já corri o mais longe que pude.
Estou cansado.
Só há uma saída agora. Uma única saída!
Mas o preço é muito alto, eu não posso pagar. Ainda não.
E enquanto estou sentado no verde gramado sob a sombra terrível da Máquina, sinto o vento frio que foge dela e ouço o rizo alegre daqueles que conseguiram pagar o preço da morte.
Como eu queria ir junto. Mas não consigo.
Ainda não.
Os gritos se aproximam a cada segundo.
Ela nunca conseguirá quebrar meu espírito, é por isso que doerá tanto.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Dinossauros

No dia de minha morte eu vaguei pela Terra escaldante uma última vez.
Já não podia mais sentir os pés pois estavam queimados assim como a pele grossa de minhas costas.
O ar sufocava a cada respiração. Eu o sentia entrar passar pela garganta até os pulmões e queimava por dentro. Sentia gosto de sangue escorrendo na garganta.
Ao longe eu podia ver o vapor subindo do chão levando as últimas gotas de água. Já não havia mais cheiro de carne podre, minha família havia ficado para trás.
O céu estava branco.
Esse foi o cenário do dia de minha morte. Lá no alto um segundo Sol se aproximava. Sua luz e seu calor eram incrivelmente superiores aos do primeiro.
Os fracos morreram, mas eu ainda resistia em minha última hora.
Senti o cheiro e vi ali caído no meio do nada uma camarada ainda vivo. Podia-se ver suas costelas se movimentando num esforço descomunal para continuar respirando aquele ar apocaliptico.
Como somos tolos! Porque continuamos respirando nesses dias?

O velho instinto tenta aguçar meus sentidos e minha mente entra no estado de batalha uma última vez. Lá dentro a voz de infinitos ancestrais gritam dentro de cada veia e suas vozes ressoam em minha mente insignificante. A mensagem é clara: "SOBREVIVA!"
Não tenho capacidade para sobrepujar a vontade. Me aproximo para atacar como sempre fazia quando meus companheiros estavam comigo mas não tenho forças, minhas pernas não respondem, não enxergo como antes, não consigo respirar.
Num último impulso de vontade de vida o moribundo a meus pés se assusta e, antes de perder a consciência, acerta um golpe profundo rasgando minha pele e entranhas. Desvaneço e desmorono ao seu lado. Somos o mesmo.
Meu olho queima em contato com o chão escaldante. Sinto cheiro de carne queimada. Não importa mais, o calor destruiu meus nervos.
Me entrego completamente ao fim e descanso pela primeira vez em minha vida. Não há mais pelo que lutar.
O sangue escorrendo penetra no solo mostrando-me o caminho.
Minha carne se espalha e frita no chão seco e eis o que vejo em meu último dia: o segundo Sol cai sobre Terra para acabar os poucos que restaram. Vejo o céu se transformar em fogo e um estrondo destói o que me resta de audição.
Foi a coisa mais linda que ninguém jamais viu e jamais verá verá. Foi o último dia de minha vida. O fim da luta.
O alívio absoluto toma conta de meu corpo e já não sinto nada. Nada mais a temer.
Meu espírito morre junto com meu sofrimento.

domingo, 11 de abril de 2010

À Noite

Lembrei-me de uma coisa que me entristeceu.
Às vezes de madrugada eu sinto o espírito de um velho cachorro meu andando na cama. Não sei se é sonho ou se é de verdade, mas acontece com certa frequência e me dá arrepios. Ele sempre fazia isso quando era vivo pois era bem pequeno e podia dormir na cama.
Se acotecer novamente eu tentarei reunir coragem para levantar a cabeça, olhar e talvez conversar um pouco com ele e perguntar como é morrer.
Constantemente eu o vejo em sonhos onde as pessoas me dizem que ele não havia realmente morrido, mas nunca me dizem o motivo pelo qual todos pensavam que sim.
Me emociono todas as vezes.
Mas esse negócio de ele ficar andando na cama me dá medo.

domingo, 4 de abril de 2010

O Coração da Criancinha

Há alguns anos havia uma criança que, brincando e se escondendo por ruas escuras, encontrou um monstro que a comeu viva.
Mais tarde o monstro defecou e em meio aos fétidos excrementos, cabelo não digerido e vermes, a merda tomou consciência, encontrou o coração daquela criança e disse consigo mesma:
"Hoje sou merda, mas um dia fui aquela criança alegre que brincava de esconder pelas ruas escuras com seus amiguinhos. Este era meu coração e agora é o que tenho de mais precioso."

Ainda não perdi aquele meu coração.
Hoje vivo num mundo de excrementos que se disfarçam de homens e se esquecem de que um dia foram criancinhas comidas pelo monstro e que hoje não passam de merda disfarçada igual a mim.
Mas eu me lembro, pois guardo o coração ainda sujo e agonizante daquela criancinha que perde seu calor a cada dia e apodrece.
Eu sei que um dia eu terei que enterrá-lo pois o cheiro é insuportável.
Sei que um dia me esquecerei.
Sei que um dia atrairei outras crianças para o monstro comer.

sábado, 3 de abril de 2010

Cemitério de Vagalumes

Eu nunca terei um filho.
Seria insuportável a culpa de quando eu olhasse aquela criança e pensasse em todo o sofrimento que ela terá quando começar a entender o mundo e que só vai aumentar até que um dia ela morra em forma de adulto.
Sinto a mais profunda tristeza quando vejo crianças brincando e simulando o mundo adulto em suas fantasias com grande expectativa de se tornarem pessoas grandes e poderem fazer o que quiserem. Que crueldade sem tamanho cometemos: deixamos elas sonharem e viverem felizes enquanto podem, criarem suas esperanças e sonhos para mais tarde serem devoradas e cagadas em forma de cidadãos. Deixamos que elas cresçam completamente desprevenidas!
Não deveríamos deixar que criassem esperança, pois ela é a mãe do sofrimento.
Em 6.000 anos de história nenhum esforço foi realmente efetivo contra o sofrimento humano. E não me refiro a fome, guerra e doenças, mas ao sofrimento cotidiano. Aquele de cada dia de trabalho e de frustrações, de cada desejo e sonho que não pode ser alcançado, de cada pedaço de nossa vida que tentamos desesperadamente cobrir com o pouco de alegria que conseguimos, de cada madrugada em que você não quer dormir por causa da promessa de um "novo" dia que virá depois.
Estou falando daquele sofrimento de quando você percebe que vai perder toda a sua vida se matando de trabalhar dia após dia perseguindo algo que nunca vai encontrar correndo em círculos e vendendo aquilo que tem de mais precioso para alimentar um sistema monstruoso que te manda produzir e reproduzir mais e mais para no fim ser descartado e enterrado como se tivesse vivido plenamente.
Eu não quero ver uma criança saindo de casa para viver num mundo desse.
O maior favor que se pode fazer a todas essas almas ainda não nascidas que esperam inocentemente do outro lado é combater a procriação da espécie humana que, diga-se de passagem, já está condenada e deveria ser eliminada da mesma maneira que se amputa uma perna podre ou se sacrificada como um animal agonizante.

Aqui vai um vídeo para levantar o astral.