quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

O Sonho

Perguntemos-nos: Qual é a diferença entre o sonho e a realidade.

É claro, o sonho não tem a consistência que há no "estar-desperto". Porém, só podemos dizer que o sonho é inconsistente, pois temos um mundo mais consistente com o qual compará-lo, e só dizemos que este mundo é consistente pois temos um mundo menos consistente com o qual fazer a comparação.
Então, "ser real" não é algo absoluto. É mais correto dizer "mais real", pois só existe real em comparação ao falso, ou seja, o "menos real".
A diferença entre sonho e realidade se dá, então, no fato de que nesse, há um momento em que despertamos.
O único meio de sabermos que o sonho não é "real" é o fato de termos este outro mundo para fazer a comparação.

Será possível despertar neste nosso mundo, isto é, despertar estando-se desperto, e encontrar outro mundo que nos faria ver este daqui como tão falso quanto um sonho? Como seria uma pessoa assim desperta?
Imaginemos que uma pessoa nasce dormindo e vive sua vida inteira deste modo, sonhando o tempo todo.
Esta pessoa nunca terá este mundo que temos para dizer que o seu não é real, então o sonho é a sua realidade, e talvez, dentro de sua realidade, ela durma e tenha sonhos dentro dos sonhos, então ela dirá que seu mundo é real com tanta certeza quanto nós dizemos que o nosso o é.
E se acordarmos esta pessoa?
Você é uma pessoa assim, você vive num sonho, existe outro mundo para o qual você está dormindo. Para ver este mundo é preciso despertar deste sonho, e isto não é uma tarefa fácil.
Este texto é o próprio sonho tentando te alertar.
Tente provar o contrário, não para mim, afinal, sou apenas parte do sonho. Tente provar a si mesmo que você não está sonhando e que não existe um mundo "mais real" do que este.
É impossível, entretanto, que eu lhe prove que o que digo é verdade.
Tais pensamento conduzem à insanidade, e insanidade é despertar.
Tudo que se pode fazer é tentar despertar, pois se não o fizer, nunca se saberá se está sonhando.

Resumindo: Só podemos dizer este mundo é real porque existem outros mundos menos reais do que ele.
Então, este mundo só é mais real em comparação com um menos real
assim, nada impede que hajam outros mundos mais reais do que este.
Real e falso é relatividade.

"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música."
Nietzsche

E agora? (Hello Nietzsche ♥)

Façamos um exercício de honestidade.
Veja alí: lá vai aquele homem louco falando sozinho. Ele acredita que tem um outro com ele, e os dois se divertem à beça conversando o dia todo. E um não vive sem a companhia do outro, pois não poderiam suportar a solidão.
Na verdade, eles se conheceram no momento de maior solidão.
Aquele homem havia perdido a casa e a família, estava arrependido de tudo que fizera na vida, estava a beira do suicídio. Então os dois se encontraram num bar e não se separaram mais.
Agora sempre que surge algum problema, ou o passado voltava para deprimir, o amigo está sempre lá com um ombro para chorar.
Lá vai este homem no meio da rua falando sozinho. Deve ser esquizofrênico o pobre diabo. As pessoas têm medo de chegar perto. Algumas batem e chutam.
Na verdade, a maioria deseja que ele morra logo.

Agora olhe alí. Lá vai aquele outro homem indo à igreja com sua família. Este sim é um homem perfeitamente normal, veja: ...mas espere. Ele está falando sozinho igual ou doido. Veja! Ele está extasiado gritando e pulando! Ele está falando com outro homem imaginário igual ao amigo do doido.
É claro que este amigo tem muito mais influência nas rodas, afinal, são muitos os doidos que o vêem.
E este amigo imaginário surje numa época parecida com a daquele outro, mas este é o Amigo Imaginario Padrão.
Assim você pode ficar louco sem fugir do Padrão do rebanho. Está é a loucura oficial da sociedade, e só ela é permitida.

O que é a "verdade"?
Ora, a "verdade" é a mentira convencional.
A verdade é a mentira que foi aceita por todos, ou pela maioria. No final tudo é mentira, mas algumas são mais bonitas.
É tudo uma questão de padronização e de utilidade, afinal nós seres humanos, não passamos de meros animais de rebanho, sem metáforas ou analogias. É isso mesmo o que somos. Igual às ovelhas.
A única diferença é que somos um pouco mais difíceis de controlar. Mas só um pouco.

Agora veja aquele outro maluco alí.
Ele se mata de trabalhar todos os dias. Vendeu sua juventude por um salário mínimo.
Não importa o quanto ele se esforce, o quanto sue, o quanto sangre, o quanto passe fome, o quanto tolere, o quanto sofra, ele sempre terá que acordar amanhã e fazer tudo de novo.
É claro que ele tem uma saída simples que todos conhecemos, mas este doido também tem o Amigo Imaginário Padrão que sussura coiss em sua cabeça. Ele diz: "Não se importe com o sofrimento, é tudo ilusão. Quanto mais você sofrer, mais você terá prazer depois da morte. Eu gosto de vocÊ assim, pois eu não gosto de quem não sofre. Sofrimento é a melhor coisa dessa vida, por que quanto mais sofriento você conseguir na vida, melhor vai ser o presente que eu vou te dar depois!"
E assim ele se vende mais e mais e sofre mais e é mais submisso e mais obediente e mais doente e dependente. E tudo isso com um sorriso no rosto.
E no final é isso que importa. Depois que ele morrer não terá mais nenhuma serventia. O importante é que se conseguiu disfarçar a escravidão e fazê-lo, ainda, ficar feliz com isto.
Grande feito! Grande feito!
Pobre coitado. Não sabe que seu Amigo trabalha para os Poderosos, que são aqueles que realmente podem comprar e vender vidas.

Uma mentira contada muitas vezes e com muita convicção torna-se verdade.

Estamos em pleno século XXI. Devemos rir de nós mesmo se ainda tentamos procurar algum motivo para continuar aqui.
O que estamos fazendo? O que?
NADA!
Não existe progresso, isto é, o desenvolvimento (científico, social, "espiritual" que seja) não leva a lugar nenhum. De fato, não há este "lugar" ao qual a história vai nos levar, a não ser que seja a destruição.
Só vivemos então por conta da ignorância e da busca do prazer.
No fundo estamos todos dizendo "Que me importa se o mundo vai acabar? Eu vou morrer de um jeito ou de outro. Todos vão morrer de um jeito ou de outro."
E estamos errados ao pensar assim?
Somente alguém que acredita numa essência oculta da existência pode contrariar este ponto de vista. Mas como foi dito, estamos em pleno século XXI, Deus está morto(embora seu cadáver permaneça insepulto). Não há ninguém para nos responsabilizar e ninguém para responsabilizarmos. Estamos sozinhos no mundo e somos donos e senhores de nossos próprios atos.

Apenas os loucos são iludidos pelo Amigo, e estes loucos são a maioria esmagadora da humanidade.
O que fazer então?

No fim das contas, somos apenas seres humanos. Fomos cruelmente jogado neste mundo e providos de consciência. O que se pode esperar de criaturas assim?

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Niilismo Existencial

Por que existem as flores?
Ora, para que os insetos a polinizem. Os insetos a polinizam para que elas virem frutos. Elas virem frutos para proteger as sementes. As sementes existem para que novas árvores nasçam.
Errado!
As flores não existem para cumprir alguma missão de serem polinizadas e assim por diante. Não. Elas existem, e é só.
Não existe esta relação de finalidade das coisas, ou seja, nada existe com alguma missão ou por algum motivo. As coisas simplesmente existem, e é só.
A vida é nada além de um fato. Não estamos para fazer nada, isso de motivo é delírio de nossa razão que procura motivar tudo o que vê.
É claro que criamos as coisa para suprir alguma necessidade. Por exemplo, uma caneta existe com a finalidade de escrever. Ela existe para isso. Este é o motivo pela qual foi criada. Mas este motivo só existe em nossa concepção, em nossa mente, em nossa representação do mundo.

O ponto em que quero chegar é este:
Quanto esforço foi desprendido pelas maiores mentes da história de nossa humanidade na procura de uma razão pela qual somos, mas ainda hoje, depois de milhares de anos, ainda não se encontrou nada, e isto se dá por um motivo muito simples: é impossível encontrar algo onde não existe nada.
A frase" Estamos aqui por que..." Não tem fundamento. A única coisa certa é "Estamos aqui." e ponto final.
"Por que existo" é uma coisa e "para que existo" é outra.

Por que existo?
Porque bilhões, trilhões de pessoas se reproduziram e se reproduziram e se reproduziram através dos milênios até que, numa destas reproduções surgiu eu. Esta é a CAUSA.
Para que existo?
Nada!
Para que existiram estes tantos bilhões e trilhões se reproduzindo descontroladamente?
Nada!
Quando eu fui criado, haviam milhões de espermatozóides tentando fecundar o óvulo, mas só o meu conseguiu.
Por que eu?
Nada!
Eles existiram e eu existo e outros vão existir, e ponto final. Não há nada além disso.

A flor existe: fato.
Ela tem pólen: fato.
O inseto espalha o pólen: fato.
A flor vira semente e fruto: fato.
A semente gera outra planta: fato.

Não existe motivo. É tudo uma cadeia de acontecimentos, tudo causa e efeito, e isto é tudo. Não há razão em nada fora de nossas cabecinhas.
Nada!
Assim é fácil ver que não existe motivo: uma pedra caiu encima de outra (causa) e as duas se partiram (efeito).
Por que se racharam?
Porque uma uma caiu encima da outra.
Para que se racharam?
Nada!

E é isto, estamos aqui e vivemos pelo mesmo motivo que as pedras se racham: nenhum.
A essência de tudo é só causa e efeito (consequencia). Não há nada além.

As coisas simplesmente são, e é isto.

Aqui tem um texto muito inspirador sobre o Niilismo: http://ateus.net/artigos/filosofia/niilismo.php

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Devir

Daqui a cem anos (ou um pouco mais), é certo que todas as pessoas que estão vivas hoje estarão mortas, mas ainda assim existirão tantas, ou, como é bem provável, mais pessoas do que existem hoje.
Serão todas elas pessoas diferentes das de agora. Será outra humanidade completamente diferente que viverá no seu "presente" e o agora será "passado", como as águas do rio que passaram ontem, pois somos todos filhos do Devir.
E Ele é o mestre de tudo.

Sabemos que nada é eterno. Todas as coisas que surjem em nosso mundo são destruídas. Tudo que está sujeito a surjir está sujeito a cessar.

"Tudo que brilha se torna ferrugem;
tudo que está no tempo torna-se poeira."

Isto não é totalmente correto, pois, se pensamos que alguma coisa se quer surje, é porque nossa visão é limitada e vivemos num período tão pequeno no tempo quanto um inseto num jardim.
Lá vai a formiga pensando sobre como seu formigueiro já estava lá quando ela nasceu e ainda estará lá quando ela morrer. Não lhe passa pela mente que aquilo é só um buraco no chão, e que ele não dura depois da próxima chuva.

É fácil pensar que o que vemos nas nuvens são apenas formas que elas assumem ocasionalmente em seu movimento ininterrupto.
Mas é difícil pensar que o mesmo se da com tudo a nossa volta: o chão, o ar, a mesa, as árvores, o sofá, o próprio corpo.
Estes objetos são apenas formas temporárias e não existem a não ser na hora em que lhe damos um nome. São como rostos que se formam nas ondas dum rio.
Mesmo eu e você somos apenas uma forma temporária assumida pela matéria em seu movimento perpétuo.
E estas são as únicas coisas que existem: a Matéria e o Devir, pois o Devir é a matéria e a Matéria é o Devir.
Mesmo meu corpo como é agora não é o mesmo que era quando criança. Células morreram e outras nasceram a partir do que é assimilado e do que vem da terra e para ela voltará e meu corpo não é senão mais um escravo do Devir, Senhor do Universo.
Pois o Devir é o Movimento, a Mudança, o FLUXO, e esta é a essência de tudo o que existe.

"É impossível entrar num rio duas vezes, pois na segunda vez já não será o mesmo rio."

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O Meio

Meu rosto queima em contato com o chão escaldante.
Cheiro de carne queimada.
Não importa mais: o calor destruiu meus nervos.
Meu sangue escorrendo penetra no solo mostrando-me o caminho.
"Tome. Pegue tudo de volta. Sempre foi seu e sempre será."
Minha carne se espalha e frita no chão seco. Meu espírito morre junto com meu sofrimento.
Não há mais nada do que duvidar. Nada mais a temer.

A mais completa solidão já experimentada

Música

Certa manhã, acordo-me de sonhos inquietos e encontro-me deitado comigo mesmo.
Isso mesmo, literalmente, lá estou eu espantado olhando para mim mesmo bem do meu lado ainda dormindo. Terei morrido?
Me levanto desesperado e penso em gritar por ajuda, mas vejo que é inútil. Não há mais nada a se fazer depois que se está morto.
Mas espere.
O que vejo agora é ainda mais perturbador. Vejo o outro eu que dormia acordar e se levantar sem se dar conta de minha presença.
Percebo então que não estou morto, mas apenas saí de mim mesmo.
Que sonho estranho e terrível. Tento, mas não consigo acordar dele.
Vejo eu mesmo andando pela casa e não parece que nada lhe falta.
Eu grito e ninguém me ouve, tento mover as coisas, mas ninguém me vê.
Que tipo de demônio entra no quarto das pessoas e as separa de si mesmas?
Que coisa horrível, o que será e mim? Esta é a mais completa solidão já experimentada.
Terei eu simplesmente me aborrecido de mim e me livrado de mim mesmo? Quando isso aconteceu? Não me lembro!
Tenho todas as minhas memorias, e o outro eu também parece ter. Nada mudou em nós.
Talvez eu seja simplesmente ma cópia daquele que penso ser eu, mas nada tenho a não ser suas memórias.
Talvez eu nunca tenha existido antes deste momento.
Tudo que penso que só é apenas uma cópia daquele que vejo alí.
.
Passa-se o dia, passam-se as semanas os meses e os anos.
E lá estou eu e aqui estou eu.
Vivo todos estes anos como um fantasma seguindo a mim mesmo.
Durante algum tempo eu tentava aparecer nas fotos, ou tentava causar interferência na tv para que me vissem. Tudo em vão.
Eu nada podia fazer a não ser ver a mim mesmo vivendo sem nunca saber de minha existência, sem nunca sentir falta de mim.
Se eu não sou eu, então o que sou?
.
Bom agora, depois de tanto tempo, decidi abandonar aquele que costumava ser eu e partir para outro lugar, pois aquele já não é mais eu. Somos "pessoas" completamente diferentes agora.
Não é "eu", agora é "ele".
Me pergunto se continuarei assim depois que ele morrer.
Não importa, já não sinto mais nada. Meu espírito está se esvaindo e eu sei que algum dia vou simplesmente desaparecer.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Como somos feitos de nada

Toda consciência é consciência de alguma coisa.
Tenho consciência do que faço, do que vejo, do que sinto, do que penso...
Posiciono-me fora de algo para poder "ver" este algo e saber que ele está lá e é diferente de mim.
Porém, tenho consciência de mim mesmo, isto é, a consciência é ciente de si mesma.
Mas nós não sentimos esta consciência o tempo todo do mesmo modo que não sentimos a roupa em nosso corpo o tempo todo, embora ela esteja lá. Só percebemos prestarmos atenção.
Porém é mais difícil perceber a consciência da conciência. E é uma experiência aterradora.
O que acontece é que a consciência sai de si para reconhecer a si mesma como algo fora dela, e a sensação é de que se está observando a si mesmo fora de si. E então percebe-se que a mente não tem fundações e o "eu" é nada.
Somos feitos de nada.
.
A percepção vaga deste nada, porém, é inerente de todos nós, e por isso estamos continuamente tentando encontrar bases para nós mesmos, e daí vem a angustia de nunca conseguir encontrar uma base.
O ser humano é uma criatura sem lar.
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Somos escravos disso. Tentando inutilmente preencher o Nada a cada dia, cada hora, cada segundo, cada respiração, cada movimento e pensamento.
Mas não se pode preencher o Nada. Nunca chegaremos a lugar nenhum.
Desistamos.
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(Sartre, Hegel, Husserl, Heidegger)